Carmen Sílvia Musa Lício
Em 1970, aconteceu um acidente de carro comigo e com alguns dos meus familiares, e minha irmã morreu, após 3 dias em estado de coma. Ficou na cabeça de todos, inclusive na nossa, por que Deus permitiu tal barbaridade acontecer à uma adolescente de apenas 15 anos, tão cheia de vida, tão meiga e doce, que gostava de todos sem distinção???
Este acidente veio ceifar a vida de uma jovem no início da sua vida, com tantos planos a concretizar, tantos planos a sonhar...
Nilza Maria era a mais amada entre os irmãos, pelo seu carisma, pela sua calma, seu sorriso tranquilo, seu amor estampado... Nunca a vi praguejar, xingar alguém, desejar o mal a quem quer que fosse... E se tinha inimigos, nunca o soubemos, pois em seu enterro compareceram a escola inteira na qual estudávamos, toda a igreja, familiares, vizinhos; enfim, uma multidão...
Como esta tragédia atingiu a família de um pastor, deixando-o bastante machucado, a minha mãe (que quase teve o braço amputado) e a mim que estava junto, ficaram em nossas mentes e corações muitas dúvidas, humanas e previsíveis...
Como Deus, em sua Sabedoria, Seu imenso Amor, Sua Onisciência, Seu imenso Poder, Sua Onipresença, poderia ter permitido tal coisa à família de um servo Seu, tão dedicado e amoroso???
Será que Deus cochilou, dormiu e não Se importou em proteger a filha de um servo Seu, que tanto batalhava na Sua obra e deixou-nos à mercê das intempéries da vida?
Não pensem que foi fácil ruminar e deglutir todos estes acontecimentos sem que a nossa fé fosse duramente abalada e provada!!!
Não vou descrever aqui todos os acontecimentos, as dúvidas , as "ruminâncias" em nossas almas, todo o processo pelo qual cada um da família passou, cada um respondendo à sua maneira aos acontecimentos que chocaram nossas vidas...
Sei que nesta época eu e a minha irmã, minha melhor amiga, havíamos acabado de nos converter e estávamos muito felizes pelo que Deus estava fazendo em nossas vidas e, após pouco mais de dois meses, acontecia isto, acabando com os nossos planos de nos casarmos e morarmos em casas contíguas, só separadas por um portão...
Tantos sonhos espalhados pelo chão, abalroados por aquele caminhão!!!
Mesmo sem saber muito bem o que pensar, aceitei tudo o que aconteceu, meio perplexa, mas sabendo que Deus estava no controle, e que sabia o que era melhor para nós... Nunca vi meu pai nem minha mãe reclamarem de nada, apesar de ver estampados em seus rostos uma tristeza tão doída, tão profunda, que nos deixava sem ação... sem saber como agir para tentar faze-los esquecer de todo este sofrimento, ou pelo menos dar uma trégua, nem que fosse por um momento...
Então, uma noite, meu pai fez um sermão, dentre os muitos que me marcaram, que falava sobre Jó... Não me lembro muito bem o seu desenvolvimento, mas como pastor presbiteriano, seus sermões tinham sempre um "arcabouço", com início, meio e fim.
E meu pai era muito inteligente!
Ele falou sobre a história de Jó, de todas as suas tribulações, suas aflições, com a perda de todos os seus bens, seus filhos, tudo; só restando sua mulher, que dizia para que ele amaldiçoasse ao seu Deus e morresse... (Com uma mulher destas, para que inimigos???)
Falou também como os amigos de Jó diziam que ele deveria estar recebendo o merecido castigo por algum pecado oculto, o julgando impiedosamente!!! (Com amigos como estes, para que inimigos???)
Disse ainda que Jó disse a respeito de Deus, no final do seu livro: "Bem sei que tudo podes, e nenhum dos seus planos podem ser frustrados" e "antes eu o conhecia só de ouvir falar, mas agora os meus olhos te veem"... Demonstrando assim que todas estas experiências terríveis serviram para ele conhecer mais a Deus, de uma forma profunda e pessoal!!!
Terminou seu sermão dizendo que, quando uma tragédia nos acontece, temos a tendência de falar que estamos passando por uma prova de fé!!!
Mas quando acontece uma tragédia a outrém, achamos que deve ser o castigo de Deus, a mão de Deus pesando sobre o miserável pecador, como se não fôssemos também miseráveis pecadores diante do nosso Deus, que é Santo!!!
Finalizando, disse que não nos cabe julgar, mas orar por estas pessoas...
Desde então, quando vejo qualquer tragédia, procuro não julga-los, pois isto não nos compete; só a Deus, que tudo vê e sonda cada coração e a intenção deles...
Li a respeito desta tragédia que ocorreu na igreja Renascer, ao desabar o teto da igreja, ceifando vidas e deixando muitas vítimas, e concordo em muitos aspectos com o que li, que "não importa como as pessoas morrem, mas como viveram as suas vidas"...
E aqui quero deixar claro que só importa como eles viveram, se a sua fé foi depositada em Jesus, tendo-o aceitado como Salvador; pois a fé sem obras é morta, mas as obras sem o fundamento, que é Jesus, como Salvador e Senhor das nossas vidas, é totalmente inútil para nos salvar; pois a Salvação é pela graça, mediante a fé, não por obras para que ninguém se glorie... E as nossas melhores obras são, diante de Deus, como trapos de imundície!!!
E isto não sou eu quem digo, mas a Palavra de Deus!!!
Então, oro a Deus, para que tenha misericórdia deste povo, que o Senhor lhes dê o Seu Consolo, que nisto tudo eles possam se aproximar mais de Deus, entender os seus propósitos, pois Deus é o nosso socorro bem presente na tribulação... em quem não há sombra de dúvida!
Que Deus possa acrescentar-lhes mais e mais fé!!! E consolo, e graça abundante!
Não tenho resposta para todos os males que nos sucedem, mas... o que eu não consigo entender, a Deus pertence!
Obs: Os parênteses são meus, e aqui vai o último:
(Nós, como irmãos, a julgá-los, como poderemos mostrar ao mundo que somos diferentes???)
Não nos cabe julga-los, mas ampara-los em oração